ENTREVISTA: Arlindo Oliveira teme menos eficácia da desinformação do que ineficácia da informação (C/ ÁUDIO E VÍDEO)
*** Alexandra Luís (texto) e Jorge Coutinho (vídeo), da agência Lusa ***
Lisboa, 07 abr 2024 (Lusa) - O professor catedrático do IST Arlindo Oliveira afirma, em entrevista à Lusa, que tem menos medo da eficácia da desinformação do que da ineficácia da informação, salientando que atualmente é "mais difícil" fazer as pessoas mudarem de opinião.
Arlindo Oliveira vai presidir ao 33.º congresso da APDC, que se realiza em 14 e 15 de maio, em formato híbrido, a partir do auditório da Faculdade de Medicina Dentária de Lisboa, e que este ano decorrerá sob o mote "40 years futurizing".
"A tecnologia ajuda e o risco de desinformação personalizada usando inteligência artificial é seguramente um risco, não nego", afirma o professor do Instituto Superior Técnico (IST) e presidente do INESC.
"Por outro lado, também é verdade -- e há estudos que mostram isso -- que as pessoas são cada vez mais difíceis de convencer do que quer que seja, mesmo de coisas que são verdade, as pessoas que acreditam que a terra é plana não desapareceram", argumenta o investigador do INESC-ID.
Aliás, "a minha sensação, e há estudos que mostram isto, é que o número de pessoas que é influenciável e pode ser desinformado de maneira a mudar a sua opinião política, por exemplo, é muito pequeno", acrescenta, apontando que a "maior parte das pessoas sofrem exatamente" do problema oposto.
Ou seja, "estão entrincheirados numa dada posição e nada, nem os argumentos mais racionais, os fazem" sair "e, portanto, a meu ver, limita um bocadinho o poder da desinformação".
Claro que mudar a opinião de 1% ou 2% das pessoas "é relevante e pode afetar uma eleição, mas não é tão grave como se pudéssemos mudar a opinião de 20% a 30% das pessoas com informações falsas", prossegue.
Neste momento, "toda a informação científica que existe é que é cada vez mais difícil fazer as pessoas mudar de opinião com argumentos racionais e verdadeiros, porque as pessoas realmente não ouvem, não prestam atenção, não são influenciadas", diz o académico.
A desinformação "pode ser eficaz e desinformar e enganar pessoas, mas neste momento o nosso maior problema é que a informação real não chega suficientemente fundo porque muitas pessoas obtêm sua informação de maneira superficial e têm as suas ideias já feitas através de um de um conjunto de mecanismos que não são fáceis de mudar, explana.
"Estou convencido de que o problema é mais profundo", "o excesso de informação disponível faz com que as pessoas possam escolher aquilo que lhes apetece, de uma maneira geral" e, nesse sentido, "enquanto que antes abríamos um telejornal ou comprávamos um jornal, neste momento poucas pessoas fazem isso", aponta.
Na nova geração, praticamente "ninguém faz isso", pelo que as pessoas escolhem informação que querem e, portanto, "estão imunes de alguma maneira a ouvirem informação que diverge daquelas em que acreditam".
Como é que o jornalismo pode atacar esta questão é uma "pergunta para a qual eu não tenho realmente resposta", afirma, acrescentando que "o próprio jornalismo está um bocadinho debaixo de ataque porque as pessoas deixaram de ver o jornalismo no seu sentido vasto como a única fonte de informação possível, como uma fonte de informação relevante (...), as pessoas obtêm informação de muitos outros lados, das redes sociais em particular, mas há outras" fontes.
O próprio jornalismo tradicional está "sob ataque" no seu modelo económico, o que "também obrigada a uma abordagem -- pode chamar-se sensacionalista -- mas vai dar ênfase e dar foco às questões que mais prendem a atenção, que nem sempre são as que melhor informam", aponta Arlindo Oliveira.
"O foco que é colocado em questões negativas de justiça, de corrupção, de aquecimento global", entre outros temas, "faz com que as pessoas tenham um foco enorme nestas questões negativas e que provavelmente vejam a sociedade e a economia de maneira muito mais negativa do que ela justifica", considera.
Aliás, "Portugal está muito melhor agora do que estava há 50 anos, ninguém tem dúvidas sobre isso", mas uma franja "significativa das pessoas não concorda com esta afirmação, o que é estranho", lamenta.
"Tenho mais medo das questões relacionadas com a manipulação de informação e desinformação nas eleições norte-americanas do que nas eleições europeias", refere, a propósito dos sufrágios que vão decorrer este ano.
"Acabamos por ter mais poder nos governos dos países do que propriamente" nas eleições europeias, remata.
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