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Senador acusa Bolsonaro de desconhecer gabinete de desinformação

epa08424471 Brazilian President Jair Bolsonaro speaks to reporters at the entrance to the Palacio do Alvorada, in Brasilia, Brazil, 15 May 2020. Bolsonaro played down accusations of interference of the Federal Police corp, arguing he is protecting his family security. Bolsonaro also dealt with the resignation of health minister Nelson Teich on 15 May 2020 less than a month after Teich took the post amid the pandemic crisis in the country.  EPA/Joedson Alves

Brasília, 16 mai 2020 (Lusa) - O presidente da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das 'fake news' brasileira afirmou "não ser inocente" ao ponto de acreditar que o chefe de Estado não tenha conhecimento de um gabinete de desinformação instalado no palácio.

Em entrevista à agência Lusa, Angelo Coronel deu detalhes de um suposto grupo de disseminação de notícias falsas, conhecido como "gabinete do ódio", instalado numa sala ao lado do gabinete do Presidente, Jair Bolsonaro, em Brasília, com "várias máquinas e pessoas a trabalhar" no disparo em massa de 'fake news', principalmente através da plataforma de mensagens WhatsApp.

Questionado se acredita que Bolsonaro tenha conhecimento da existência e trabalhe em conjunto com o "gabinete do ódio", o senador afirmou ser "difícil confirmar", mas advogou que o Presidente "não é tão inocente para deixar esse ato passar despercebido".

"É difícil aferirmos, confirmarmos, mas também não vou ser inocente (...) de achar que caso se confirme este 'gabinete do ódio', vizinho à sala do chefe de Estado, onde os próprios filhos são os artífices, que Bolsonaro não saiba. O Presidente não é tão inocente para deixar esse ato passar despercebido. Então, tudo isso são suposições, mas nós vamos no encalço para investigar", disse o senador.

Criada em agosto do ano passado, e presidida por Angelo Coronel, a CPMI das 'fake news' no Brasil foi fundada com o intuito de investigar as eleições de 2018, que resultaram na vitória de Jair Bolsonaro como chefe de Estado do país; a violência virtual; proteção de dados; assim como pedofilia.

Fruto de vários testemunhos, entre eles de ex-aliados de Jair Bolsonaro, a CPMI recebeu denúncias sobre um alegado gabinete, localizado na sede da Presidência, dedicado apenas ao disparo em massa de notícias falsas.

"Esse pessoal que trabalha no 'gabinete do ódio', - que segundo depoimentos ainda se encontram nessa sala, o que eu não acredito, pois não seriam infantis ao ponto de serem denunciados e continuarem a fazer essas maldades -, trabalham distribuindo mensagens falsas, ferindo reputações de adversários, atacando instituições, governadores, tudo no anonimato, com perfis falsos", indicou o senador acerca das investigações que tem em curso.

De acordo com os depoimentos prestados à CPMI, o gabinete é composto por pessoas da "estrita confiança do Presidente e do seu filho Carlos Bolsonaro", que é apontado como o alegado líder dessa organização, assim como quem ordena o envio dos conteúdos falaciosos, visando atingir adversários.

No final de abril, veio a público a informação de que a Polícia Federal brasileira tinha identificado o vereador Carlos Bolsonaro como um dos líderes de um esquema ilegal de desinformação, segundo uma investigação sigilosa conduzida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), divulgada pela imprensa local.

Os media detalharam que Carlos, segundo filho do chefe de Estado, é mesmo investigado por suspeita de ser um dos líderes do grupo que cria e divulga notícias falsas, de forma a intimidar e ameaçar autoridades públicas na internet.

A Polícia também investiga a participação no esquema do seu irmão e deputado federal, Eduardo Bolsonaro.

"O Presidente Bolsonaro governa muito com os filhos, que têm muito poder perante o pai. Inclusive, a CPMI das 'fake news' descobriu, no gabinete do deputado Eduardo Bolsonaro, uma máquina onde o seu IP [Endereço de Protocolo da Internet] foi utilizado no disparos de mensagens com um perfil denominado 'bolsofeios', usado para atacar alvos", revelou Angelo Coronel, acrescentando que já entrou em contacto com diversas redes sociais, de forma a conferir o conteúdo desse material, e assim verificar se era "insignificante" ou se abalava as instituições democráticas brasileiras.

Caso se encontrem provas irrefutáveis da também participação do mandatário neste grupo de disseminação de notícias falsas, Bolsonaro pode vir a ser processado por crime de responsabilidade, o que pode levar à cassação do ser mandato presidencial através da abertura de um processo de destituição.

Um dos depoimentos mais relevantes desde a abertura desta CPMI foi prestado no final do ano passado pela deputada brasileira Joice Hasselmann, ex-líder do Governo no Congresso, que denunciou a existência do "gabinete do ódio", tendo como mentores Carlos e Eduardo Bolsonaro, e que funcionaria na sede da Presidência.

"Qualquer pessoa que eventualmente discorde [da família Bolsonaro] entra como inimigo da milícia", disse Joyce na ocasião, apresentando uma série de provas, e acrescentando que o grupo atua com uma estratégia bem definida e organizada, começando com uma lista de pessoas consideradas "traidoras" e que são escolhidas como alvo dos ataques cibernéticos.

Para Angelo Coronel, este foi um dos testemunhos mais importantes, pois veio da parte de uma pessoa que militou na campanha de Bolsonaro e que era íntima da família do chefe de Estado.

Contudo, o senador assegura que também há suspeitas da disseminação de informações falsas por parte da oposição de Bolsonaro, em "beneficio próprio ou do candidato que apoiavam" nas últimas eleições.

Angelo Coronel frisou que o disparo de mensagens não é crime perante a lei eleitoral brasileira, mas sim o abuso do poder económico, através da contratação de empresas para fazer essa disseminação, com verbas não declaradas.

A CPMI recebeu ainda denúncias de empresários com "problemas na justiça", "de ordem tributária" que terão financiado essa desinformação com o intuito "de fortalecer o Governo Bolsonaro para transformar o Brasil numa ditadura, onde o poder executivo é soberano, e onde o Supremo e o Congresso se tornem subservientes ao Presidente da República", disse o senador.

Porém, o presidente da comissão frisou que, por enquanto, são tudo suposições e que a análise de todas as provas apresentadas corre em sigilo.

No final de abril, o deputado Eduardo Bolsonaro, terceiro filho do Presidente, entrou com uma ação no STF, pedindo a suspensão da prorrogação da CPMI das 'fake news', num movimento que Angelo Coronel considerou como uma admissão de culpa.

"Se eu não tenho nada a temer, não vou entrar na Justiça para acabar com algo que me pode incriminar. A partir do momento que Eduardo Bolsonaro entra no tribunal maior do país para acabar com a CPMI, é porque está com medo de algo. Espero que não haja nada contra ele, porque não desejo mal a ninguém, mas caso ele esteja errado, ele tem de ser punido e sair da vida pública", concluiu o senador, em entrevista à Lusa.

 

Marta Moreira