ENTREVISTA: Trump: Liberdade de imprensa e instituições democráticas serão “prejudicadas” por Trump – académico
Lisboa, 16 jan 2025 (Lusa) - O sociólogo norte-americano David Altheide considerou em entrevista à Lusa que a liberdade de imprensa e as instituições democráticas dos EUA serão prejudicadas no mandato do Presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, sobretudo com ataques sistemáticos ao jornalismo.
David Altheide, especialista em comunicação,referiu que à medida que Trump vai assumindo o seu segundo mandato, várias instituições democráticas serão prejudicadas nos próximos quatro anos, através de ataques aos 'media', levando a que os editores e jornalistas das principais organizações noticiosas norte-americanas se sintam "pressionados para serem mais cautelosos em relação ao que dizem e fazem".
"Existe sempre alguma tensão entre os 'media' e o Governo, mas eu penso que essa tensão vai ser elevada a outro nível", sublinhou o professor, que esteve em Lisboa no âmbito da Winter School for the Study of Communications organizada pela universidade FCH-Católica.
A poucos dias do regresso de Donald Trump à Casa Branca, o académico norte-americano previu que os ataques aos 'media' serão acompanhados por "processos jurídicos contra as organizações de notícias por matérias publicadas no passado".
David L. Altheide, cuja investigação se centra no papel dos meios de comunicação social e das tecnologias da informação no controlo social, é professor na Escola de Transformação Social da Universidade do estado do Arizona, tendo sido distinguido com o Prémio de Especialista Fulbright na Universidade Católica em Lisboa, Portugal, na primavera de 2017.
É autor de livros como "Gonzo Governance: The Media Logic of Donald Trump" (2023), que abordam a forma como os 'media' e as redes sociais moldam as perceções públicas e amplificam fenómenos de controlo social e desinformação.
Além dos 'media', Altheide destacou igualmente que o republicano, que toma possa a 20 de janeiro, já visou outras instituições, entre as quais o setor militar, o FBI (polícia federal norte-americana) e o Departamento de Justiça norte-americano.
"Muitos dos ataques vêm de Washington. O setor militar está a ser atacado. O FBI, uma organização pouco liberal, está a ser atacado. O Departamento de Justiça, e assim por diante. Trump tem ameaçado várias pessoas em muitas dessas agências com retribuição, possivelmente no futuro, e há muitas pessoas que o apoiam", sublinhou Altheide.
Para Altheid, Trump "não se trata apenas de um Presidente de direita conservador reacionário", mas de um agente de mudança que visa desmantelar as fundações da democracia norte-americana.
"Donald Trump destruiu as linhas entre facto e ficção para destruir muitas das grandes instituições sociais norte-americanas, que, do seu ponto de vista, têm de ser desmanteladas. É a destruição e o desafio às ideias e organizações básicas, e que apenas Donald Trump as pode salvar".
O professor norte-americano sustentou que, ao longo da sua campanha às presidenciais de 04 de novembro de 2024, Trump instrumentalizou uma "política do medo" associada a sentimentos de insegurança social e económica, para criar uma narrativa de "ameaça constante" que justifique as mudanças institucionais que o futuro Presidente pretende introduzir.
"Trump, como muitos autoritários, recorre a uma lógica de medo, preconceito, desconfiança e racismo. O medo não foi a única coisa que fez com que Donald Trump fosse eleito. Nem toda a gente que votou em Donald Trump o fez por medo, mas muitos milhões fizeram-no", alegou.
Para Altheide, este sentimento de medo foi amplificado através da Fox News, uma emissora de direita que desempenhou um papel crucial na disseminação da propaganda de Trump.
"A ligação com a Fox News foi construída ao longo dos anos, até o ponto que agora, nas suas nomeações atuais de membros do seu gabinete, algumas nove pessoas que faziam parte da organização da Fox foram nomeadas para um gabinete e posições governamentais importantes".
Segundo Altheide, Trump promoveu a ideia de que, "uma razão pela qual os EUA estão a falhar, é porque as nossas instituições sociais estão corrompidas ao nível federal. E estão a falhar por causa do 'Deep State', que perpetua políticas que não são as políticas que Donald Trump quer".
Por fim, o sociólogo destacou que os tribunais norte-ameicano não têm sido "favoráveis à democracia", referindo-se à decisão histórica do Tribunal Supremo dos Estados Unidos em garantir imunidade presidencial contra processos judiciais, por atos oficiais exclusivos do Presidente norte-americano, como o perdão, o comando das forças armadas, a execução de leis ou o controlo do poder executivo.
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