Zacarias evoca EUA para sublinhar riscos de falta de regulação ‘online’

Bruxelas, 10 fev 2021 (Lusa) -- A secretária de Estado dos Assuntos Europeus defendeu hoje no Parlamento Europeu a importância da regulação do espaço digital, dando como exemplo dos riscos da propagação de teorias da conspiração e desinformação o sucedido nos Estados Unidos.
"As recentes semanas demonstraram que mesmo as estruturas democráticas mais robustas não estão a salvo de danos. O que aconteceu do outro lado do Atlântico deve ser uma advertência para o nosso debate na Europa, uma vez que as nossas sociedades democráticas não estão imunes à influência nociva do discurso de ódio, da desinformação, das 'fake news' e incitação à violência", afirmou Ana Paula Zacarias.
A secretária de Estado intervinha, em representação da presidência do Conselho da UE, num debate no hemiciclo de Bruxelas sobre o "equilíbrio entre escrutínio democrático e direitos fundamentais nas redes sociais".
Referindo-se ainda ao sucedido nos Estados Unidos -- à luz das alegações falsas de fraude nas eleições presidenciais de novembro, propagadas sobretudo nas redes sociais, que culminaram no ataque de apoiantes do ex-Presidente Donald Trump ao Capitólio -, Ana Paula Zacarias comentou que "estes acontecimentos também sublinharam a crescente importância das plataformas 'online' e empresas de redes sociais em moldar o debate publico.
E a grande interconexão crescente entre transformação digital e democracia, uma das prioridades da presidência portuguesa da UE (PPUE).
Apontando que é hoje "inquestionável" que as empresas das redes sociais têm o estatuto de praças públicas, "o que significa que devem ter responsabilidades quanto a melhorar a participação dos cidadãos e assegurar liberdade de expressão", a governante advertiu que, "no entanto, a liberdade de expressão não é absoluta: deve ser equilibrada, com o objetivo de combater o discurso de ódio, incitamento à violência e radicalização, tanto 'online' como 'offline'", pois, sublinhou, "o que é ilegal 'offline' deve ser ilegal 'online'".
A secretária de Estado notou que, além das críticas de que as plataformas sociais têm sido repetidamente alvo "pela falta de transparência na utilização de algoritmos, na moderação dos conteúdos e por visar utilizadores com base em grandes quantidades de dados pessoais gerados por atividade online", o espaço digital também se tornou efetivamente "um terreno fértil para teorias da conspiração e 'fake news'".
"A desinformação espalha-se mais rapidamente do que qualquer vírus. Educação, media e literacia digital são as melhores vacinas", disse.
Apontando que, das plataformas 'online' espera-se que "desempenhem a sua parte neste combate comum", Ana Paula Zacarias sublinhou, todavia, que "cabe às instituições democráticas, às nossas leis, aos nossos tribunais estabelecer as regras do jogo, definir o que é ilegal e o que não é, o que deve ser removido e o que não deve ser".
Nesse sentido, manifestou-se convicta de que, com todos os regulamentos que estão atualmente a ser ultimados em negociações entre as instituições neste domínio, em breve haverá um "ambiente digital mais transparente", para o qual espera também o contributo do Plano de Ação para os setores dos Media e Audiovisual, "que será objeto de conclusões do Conselho", que a presidência portuguesa tenciona concluir.
Além disso, assinalou que a presidência portuguesa do Conselho vai organizar a Assembleia Digital, em Lisboa, em junho, na qual vão ser discutidos os conceitos de democracia digital e direitos digitais, bem como uma conferência de alto nível sobre o futuro de jornalismo e a ligação com a Inteligência Artificial, com um enfoque especial na robotização de produção noticiosa.
"Os tempos atuais mostraram a realidade incontornável de que o que se passa 'online' molda as nossas vidas, crenças e escolhas. Influencia profundamente o que compramos, em quem votamos, quem escutamos e até a nossa opinião sobre vacinas", sublinhou.
Por isso, há que evitar que as redes sociais "funcionem como câmaras de ressonância que suprimam diferentes pontos de vista", e há que "garantir que os cidadãos estão equipados para gerir o fluxo de informação a que estão expostos todos os dias", pois, "em tempos como estes, acreditar em informação não credível pode ser letal".
Garantindo que a presidência portuguesa do Conselho "está comprometida em trabalhar com o Parlamento Europeu, com a Comissão Europeia e com o Serviço Europeu de Ação Externa nestas questões cruciais", Ana Paula Zacarias finalizou antecipando já algumas das questões a que, em conjunto, as instituições devem dar resposta.
"Como adaptar os nossos instrumentos jurídicos à rapidez e à imediatez do mundo online? Como alcançar e garantir o justo equilíbrio entre a liberdade de expressão, o pluralismo dos media e a proteção dos cidadãos contra o ódio e a desinformação online? Como melhorar a educação digital dos nossos cidadãos? É preciso um trabalho das instituições para dar resposta a estas questões", concluiu.
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Lusa/fim